Ad Astra
Direção: James Gray
Elenco: Brad Pitt, Tommy Lee Jones, Ruth Negga, Donald Sutherland e Liv Tyler
EUA, 2019
É interessante notar como dois dos filmes dirigidos por James Gray que mais gosto, são filmes, de uma forma ou de outra, movidos por relações familiares. Em Amantes, Leonard (Joaquin Phoenix) tenta arrumar a vida, depois do término de um relacionamento, voltando a morar com os pais; em Os Donos da Noite, Bobby (Joaquin Phoenix, outra vez) é um gerente de uma boate, cujo dono é um gângster, enquanto seu pai (Robert Duvall) e irmão (Mark Wahlberg) são policiais. Ad Astra não é diferente.
Embora se passe no espaço, o assunto de Ad Astra é a relação pai-e-filho. No filme, o astronauta Roy McBride (Brad Pitt) cruza a galáxia em uma missão secreta para encontrar seu pai, Clifford McBride (Tommy Lee Jones), desaparecido há mais de 30 anos. Ao mesmo tempo que Roy vai desvendado o que aconteceu com o pai, vai também reavaliando como como o desaparecimento deste influenciou sua escolha profissional e nos relacionamentos pessoais.
Durante toda a sua vida, Roy tomou para si o encargo de manter vivo o legado do pai. Suas escolhas foram baseados no que acreditou que orgulharia este herói nacional. No entanto, essa busca pela aprovação de alguém que não está presente, o leva a se isolar de tudo ao seu redor, incluindo a esposa (Liv Tyler) e de si mesmo. E aqui está o principal mérito da atuação de Brad Pitt. Acostumado a personagens charmosos e carismáticos, como o Cliff Booth de Era Uma Vez em Hollywood ou o icônico Tyler Durden de Clube da Luta, como Roy, Pitt dá vida a um homem distante, que oculta suas emoções, até mesmo quando sua vida está em risco, como na queda-livre que sofre após um acidente logo no início do filme, mantendo-se impassível, como se fosse um evento rotineiro. Entretanto, a medida em que a viagem vai avançando, o possível encontro com o pai se aproximando, e Roy precisa confrontar os atos do mesmo, essa frieza vai se mostrando apenas superficial. E Pitt é bastante competente em ir, aos poucos, revelando os sentimentos do personagens.
Como escrevi no início do texto, Ad Astra fala da relação pai-e-filho, mas vai além, desconstruído também a figura do herói. Primeiramente, com o próprio Roy, cujo profissionalismo é apenas uma fina casca que esconde os danos causados pela ausência do pai. Porém, mais profundamente, no personagem Clifford McBride. Astronauta laureado, herói nacional. Porém, obcecado por explorar o Universo e descobrir outras formas de vida, encontra nessa missão, uma forma de fugir do cotidiano e responsabilidades para com sua família. O que é bastante irônico: um homem empenhado em encontrar vida fora da Terra, mas que demonstra total desinteresse na vida que ajudou a criar.
De certa forma, o dilema desse personagem remete a outro explorador dos filmes de Gray. Percy Fawcett (Charlie Hunnam), de Z – A Cidade Perdida, que usa sua busca por uma sociedade perdida na floresta amazônica para escapar, no caso, não da família (embora essa sofra as consequências), mas dos meandros da alta sociedade inglesa.
Sendo assim, em Ad Astra, Gray discute a idealização, seja da figura paterna, no âmbito familiar, seja dos heróis nacionais, no âmbito de uma nação, mostrando que, em alguns momentos, é preciso destruir essas imagens para continuar vivendo. Ao mesmo tempo, a busca do McBride-pai por vida em outros planetas, enquanto abandona esposa e filho, também avalia a expansão espacial: e se estivermos mesmo sozinhos?
Triste e sutil, Ad Astra serve aos temas recorrentes na filmografia de James Gray, mas com uma ambientação bem diferente de suas outras histórias, não falhar em orquestrar muito bem as sequências de ação, como a perseguição em solo lunar.