Somos Tão Jovens
Diretor: Antonio Carlos da Fontoura
Elenco: Thiago Mendonça, Laila Zaid, Bruno Torres, Daniel Passi, Sandra Corveloni, Marcos Breda, Bianca Comparato, Conrado Godoy, Nicolau Villa-Lobos, Sérgio Dalcin, Olívia Torres, Ibsen Perucci, Edu Moraes.
Brasil, 2013.
Conferi ainda na primeira semana de exibição “Somos Tão Jovens” cinebiografia que cobre a juventude de Renato Russo até os primeiros momentos da Legião Urbana e, antes de começar a discorrer minhas impressões sobre o filme, vou logo avisando que sou um Legionário, grande fã da banda, tenho todos os álbuns, tenho na cabeça quase todas as letras das musicas, etc etc. Portanto o que falarei aqui é sobre o filme e não sobre a banda.
Como fã do Renato e da Legião acho que eles mereciam um filme melhor. A película do diretor Antonio Carlos da Fontoura tem alguns pontos positivos: a boa recriação da Brasília nos anos 70 e 80, seja nos cenários, seja nos figurinos. Outro destaque é que a cena musical da capital do país aparece bem, assim como a forma como Renato conhece o punk, de bandas como Sex Pistols e começa a ir para esse caminho. Diferente do que aconteceu no filme “Cazuza – O Tempo Não Para” em que o Barão Vermelho e a cena musical quase não aparecem.
Porém, o lado bom da força fica por aí. O restante é problema atrás de problema.
A forma como a história é contada soa superficial demais, embora a coisa esteja ali, não há aprofundamento. Já li reportagens, vi documentários sobre Renato e a banda que me deixaram muito mais envolvido do que o filme. E olha que o filme é sobre a juventude em Brasília, o Aborto Elétrico, o período como Trovador Solitário e apenas os primeiros shows com a Legião Urbana, não cobre o sucesso estrondoso da banda, os anos com AIDS, etc.
A maneira como aparece a homossexualidade, por exemplo, embora não deixe duvidas de que ele gostava de meninos e meninas, não se aprofunda no tema, só mostra uma paixão não correspondida pelo guitarrista Flávio Lemos e um rapaz que ele conhece em Brasília e dá a entender que tiveram um romance, mas o cara logo some. E quando ele conta sobre sua sexualidade para a mãe, Dona Carminha, sabe-se que na vida real foi um choque, já que se tratava de uma família tradicional, no filme se resolve em uma conversa leve e cômica.
Outro problema do filme é o elenco. Salvam-se a família: mãe, pai e irmã interpretados respectivamente por Sandra Corveloni (vencedora do prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes pelo filme “Linha de Passe“), Marcos Breda e Bianca Comparato, mas eles aparecem pouco, falando textos bem clichês e são usados mais como alivio cômico.
Dos músicos, o trabalho mais correto é o de Bruno Torres, que interpreta o baterista Fê Lemos, talvez por ele não ter aparecido tanto na mídia, então o ator deve ter tido mais liberdade para compor o personagem. O restante parece que está imitando e não interpretando, são caricaturas, é o caso do Dinho Ouro Preto (Ibsen Perucci) e do Herbert Vianna (Edu Moraes), esse ultimo é o pior, fazia tempo que eu não ria tanto no cinema, e olha que o cara só aparece em duas cenas.
Outro caricatural é o Andre Pretorius, ou Petrus como o chamavam, sul-africano, primeiro guitarrista do aborto, interpretado por Sérgio Dalcin. Os ataques de fúria dele são risíveis, assim como o sotaque que ele faz misturando palavras em português com inglês.
Vale falar um pouco mais sobre Petrus, uma das figuras mais controversas e intensas da cena da época, foi talvez o primeiro parceiro homossexual do Renato e o filme não deixa isso claro, mostra que ele volta forçado para a África do Sul, para servir ao exército e daí não se fala mais nele. E o filme se passa por 1982, quando a Legião faz seu show em Patos de Minas, no mesmo ano, Petrus chegou a voltar para Brasília mais perturbado do que nunca, depois vai para Frankfurt, onde morre de overdose. Não que desse para abordar tudo isso, mas alguém que “De todos os meninos que frequentavam a nossa casa, ele era o mais especial, muito doce e triste”, segundo dona Carminha, merecia mais destaque. Se bem que, de uma maneira geral, o filme não dá muito espaço ao restante do elenco além de Thiago Mendonça.
Que aliás também fez mais uma imitação do que interpretação, cantando não está ruim, assim como a caracterização, mas o problema é quando ele imita o timbre de Renato falando e também os trejeitos, só que de maneira exagerada. Acho o filme do Cazuza fraco, mas ao menos tinha uma excelente interpretação de Daniel de Oliveira para se escorar, o que não acontece aqui.
Outra coisa que incomoda no filme é que ficam o tempo inteiro citando nomes ou partes de musicas do Renato como se tivessem surgido naquele momento: “Estou com um tédio com T bem grande”, “Festa estranha com gente esquisita“, “Você gosta de meninos e meninas“, “Seus burguesezinhos coca-cola“. É forçar muito a barra.
Sem falar da forma como escolhem o nome Aborto Elétrico, como é conhecido, Fé Lemos, inspirado em Eletric Flag, sugere o nome Tijolo Elétrico, então André Pretórius vai e fala \”Não, vai se chamar Aborto Elétrico”, no filme chegam até a parte do Tijolo Elétrico, mas de modo forçado, Mendonça fala “Essa banda vai ser um aborto”, só então o Petrus fala em aborto elétrico.
Por fim, acaba que o mote principal que o diretor escolheu para o filme, que é a amizade com a Aninha (Laila Zaid) , não condiz com a realidade, já que ela é uma personagem fictícia que junta umas três garotas que Renato conheceu.
A melhor parte do filme mesmo é o final, em que aparece cenas de um show da Legião Urbana real mandando “Será\”.