Lia Kapp, cantora e compositora curitibana de quem já falamos aqui e aqui, lançou recentemente o EP Jupiter, que marca uma virada em sua carreira, iniciada aos 15 anos, já que agora \”Lia Kapp\” é também uma banda.
Produzido com financiamento coletivo na plataforma Kickante, Jupiter já está disponível nas redes e traz cinco faixas, duas releituras de musicas de trabalhos anteriores de Lia, além de três composições inéditas. Multi-instrumentista, Lia, além da voz, atua nas teclas e também participa na bateria e guitarra. Além dela, a banda é composta por Gustavo Mazuroski (guitarra), Erich Zimmermann (baixo e teclas) e Gabriel Bryl (bateria e guitarra).
Com toques de Doom Metal e Black Metal, Jupiter traz ainda mais peso do que os trabalhos anteriores, mas sem deixar de lado o Dark Art Pop. A banda aponta como uma de suas maiores influencias, a cantora e compositora Chelsea Wolfe.
Os vocais de Lia Kapp continuam com o peso e potência de Metamorphosis e Conflito. Jupiter, além de mostrar evolução musical, é o projeto mais ambicioso até aqui, inclusive as duas últimas faixas são oito minutos de sonzeira.
A galera da \”Lia Kapp\” respondeu nossas perguntas sobre a evolução do som da banda, carreira e outros temas.
CPR – Como foi o processo de formação da banda? Como ficou decidido que era hora de transformar um projeto que começou solo em um grupo?
TODOS: Os meninos entraram na banda a princípio para reproduzir o Metamorphösis ao vivo, coisa que era inviável com uma formação one-woman band por conta da pegada toda majestosa do álbum. Éramos todos amigos há tempo e todos sempre curtimos ouvir e fazer um som, então foi uma escolha meio lógica. Depois, assim que o Gabriel entrou, rolou uma química muito espontânea. Uma vez que a banda está formada e ensaiando algo é natural que comecem a surgir coisas novas que envolvem a criatividade de todo mundo e não só o que estava na obra original. Foi o que aconteceu quando fomos construindo Júpiter e Pasiphae sem nem falar muito sobre, só tocando, a princípio como algo exclusivo dos shows. Com o tempo percebemos que tínhamos a sinergia necessária pra construir algo coletivamente, e deu no que deu. Outra questão para nós é uma mistura de cansaço com fazer tudo sozinho com o pensamento de que \”existem pessoas talentosas demais a minha volta pra gente não aproveitar isso\”. Então a gente aproveitou.
CPR – Como surgiu o conceito do EP Júpiter e o processo de escolha das músicas, as releituras e as inéditas?
TODOS: O Júpiter se construiu principalmente durante os ensaios e a ideia inicial era registrar pra sempre o tipo de som que a gente tinha conseguido desenvolver ao vivo, uma vez que já estava bem diferente do disco anteriormente lançado. A faixa-título era uma introdução para os shows, que costumamos emendar com Prelude, do Metamorphösis. Já Verdict, que também era do Metamorphösis e ganhou uma versão nova para o EP, ficou mais caótica e apocalíptica, então costumávamos usar pra fechar o show. Mas a gente foi um pouco ambicioso demais (ainda bem) e fomos incluindo mais coisas. O Erich tinha Der Garten rascunhada e nos trouxe porque achou que seria legal abrir pras contribuições do pessoal. Na época em que estávamos começando a planejar o EP como um todo, a Lia escreveu Pasithea, e juntos fizemos com que a música virasse essa coisa cheia de fases, com um pedacinho de cada um. E, por fim, a ideia para Let Me Take Care of You, talvez a música que mais foi modificada em relação a original, era que fosse colocada no disco sem nenhuma alteração. Mas começamos a nos animar com isso de completamente reinventar ela a ponto de quase não ser mais reconhecível como a mesma música, e então a resinificamos e destruímos o que ela era antigamente. E foi a melhor coisa que a gente fez. Foi tudo como um evento astronômico mesmo, a conjunção de todos nós no mesmo espaço por eventos quase ao acaso deu origem a esse fenômeno ali, e decidimos gravar.
CPR – Como vocês analisam a evolução sonora de vocês, a mistura do Rock Alternativo com Dark Art Pop, e hoje estão com ainda mais peso adicionando uma sonoridade de Doom Metal e Black Metal. Como tem sido a resposta do publico?
BRYL: Acho que a resposta do público foi a melhor possível, mesmo com esse peso a mais trazido no Jupiter eu acho que essa influência já aparece um pouquinho no primeiro álbum da Lia (Metamorphösis). Pegamos isso e elevamos a um nível a mais, com um instrumental mais sujo e visceral.
ERICH: Eu pessoalmente acho que essas novas mesclas contribuíram para que o set nos shows fique mais costurado, sem muito espaço e choque entre as músicas, coisa que era mais possível de acontecer devido à natureza muito conceitual do Metamorphösis. E a resposta tem sido muito, muito positiva até agora! O show tem uma energia bem densa, e todo mundo que ouviu o álbum foi só elogios. Estamos muito contentes em ter agradado o pessoal, mesmo com algo que foi tão honesto da nossa parte, sem muitas pretensões.
LIA: Para mim, nós quatro conseguimos juntos fazer algo que eu sempre quis, mas que sozinha não era possível. A sensação de tudo isso é muito diferente de antigamente, me sinto muito mais contemplada com essa vibe direcionada pro metal. Olha, vou ser bem sincera, a gente só ouviu comentários muito bons! Estou tão feliz, de verdade, acredito que iremos colher bons frutos daqui pra frente! Obrigada a todos e todas que ouviram, aliás!
MAZU: Acho que o principal fator que nos fez alterar o som foi a vontade de nos distanciarmos mais de uma dependência grande de backing tracks nos shows. Tendo guitarra, baixo e bateria em mãos, queríamos tentar fazer o show se sustentar o máximo possível só naquilo. Isso refletiu em uma fluidez muito maior nos shows e eu acredito que um engajamento maior do público também, já que, por exemplo, enxergar uma bateria acústica sendo tocada é muito mais empolgante que uma programada direto no PA.
CPR – Dentro desse cenário alternativo/independente, quais as principais barreiras que vocês encontram para produzir música?
BRYL: Na minha visão estamos na época mais democrática para se fazer música, nunca foi tão fácil e barato produzir algo com o mínimo de qualidade. É claro que quanto menos poder financeiro, mais complicado fica, mas temos a sorte de poder usar o estúdio da faculdade de música da UFPR e de termos o Beto Mazuroski ao nosso lado dando bastante suporte para as gravações, o Hélcio Luz, pai da Lia, também foi de extrema importância, sem ele com certeza as coisas seriam mais complicadas.
ERICH: Quanto à questão de nos organizarmos como banda independente, creio que um dos pontos mais complicados é a questão financeira. Por sorte temos o privilégio de ter um lugar pra ensaiar, e cada um contribui com o instrumento que tem disponível e conseguimos tirar um som massa. O Beto Mazuroski e o deArtes também fortaleceram demais nas gravações, coisa que seria absolutamente inviável economicamente caso tivéssemos de apelar pra um estúdio. Além disso, o Gustavo mandou MUITO bem na mixagem e masterização, o coitado trabalhou igual um condenado, mas ficamos muito felizes mesmo com o resultado. Tudo isso, cada um dando o que pode, faz o negócio rolar mesmo que não disponhamos de um financiamento lá essas coisas. Agora, no que diz respeito ao cenário, panelinhas, panelinhas e panelinhas. Isso sempre quebra as pernas, porque impede de conseguir show, e aí a gente tem que topar cada uma… Já cheguei a ganhar quatro reais em um show, quase que tivemos de dormir na rua porque não dava nem pra pegar o ônibus pra voltar. Claro que não dá pra exigir muito num momento inicial, mas uma vez que a gente tem um investimento relativamente grande em ensaios, equipamento e tal, fica meio complicado gerenciar a questão da grana. Mas seguimos!
LIA: Bom, primeiramente acho que muito disso não seria possível sem o meu pai, então vou falar dele num primeiro momento. Meu pai foi atrás de muitas coisas para nós, conseguiu uma bateria, um carro para carregar os instrumentos e irmos aos shows, e sempre faz muito por mim e pela banda. Então esse também é um dos nossos privilégios, além dos que o Erich citou. Mas realmente ainda temos muito problema com a questão financeira. Sempre queremos nos mobilizar para fazer turnê, mas é praticamente inviável ir para outros lugares além de São Paulo. Infelizmente ainda não temos público o suficiente nas outras cidades, então por causa disso o que ganhamos acaba não cobrindo os custos da viagem. Quanto à produção da música em si, me sinto bem livre para fazer o que eu quiser. A dificuldade é fazer chegar nas outras pessoas, porque a gente sabe que a gente pode conquista-las, mas ainda falta muito. É difícil demais conseguir que elas prestem atenção, tem muita coisa rolando ao mesmo tempo na arte e na vida pessoal de todo mundo… Mas o que me chateia mais é que as bandas daqui de Curitiba me parecem um pouco fechadas demais. Sempre nós que temos que ir atrás de eventos, ninguém larga o grupo que é acostumado a fazer show. Esse ano está mais difícil ainda, não sei por quê. Mas somos abertos para fazer shows com bandas de todos os tipos. Já chamamos para tocar conosco vários tipos de banda mesmo. Então chama nois…
CPR – Qual a relação da banda com a internet? Qual tem sido a relevância das redes sociais para a divulgação do trabalho de vocês?
BRYL: A internet é muito importante para o artista independente se divulgar, mas também acho que ela traz alguns empecilhos. Podemos receber tanto elogios quanto críticas de qualquer pessoa, com qualquer abordagem, de qualquer jeito, e no caso das criticas negativas, acaba sendo muito pesado, tem muita gente agressiva na internet, por sorte isso não aconteceu com a gente ainda.
ERICH: Sem igual. Eu não sei, mas sou um crítico ferrenho dessa galera que fica \”Ai vamos nos desligar!\” porque isso aqui é o meio em que a gente vive hoje. Se eu me desligar, perco o contato com as pessoas mais importantes pra mim, que, por conta da distância e da rotina corrida que todos levam hoje, não posso me dar ao luxo de encontrar todo dia. As redes me colocam em contato com as pessoas que amo, e isso não é muito diferente com a banda. É onde conseguimos alcançar mais longe, colocar os nossos amigos que já nos acompanham a par de nossas atividades e tudo o mais. Nisso conhecemos bandas parceiras, pessoas que se tornaram fãs, e muitos mais que, caso não estivessem lá, a coisa não seria a mesma.
LIA: Desde 2015 a internet me permite levar o que eu faço a lugares muito longes de onde vivo. Nessa época fiz amizades com pessoas de vários estados que acompanham a mim e à banda até hoje, e isso é gratificante demais. Imagine se não tivesse internet, como eu falaria com eles? E, ao passar dos anos, fomos conhecendo mais pessoas e fazendo amizades com outros artistas e criando realmente uma parceria. Tem muita gente por aí que ajuda a gente de verdade, e a gente retribui. Tem até um fato curioso: esses dias um cara dos EUA nos conheceu através de um grupo de fãs da Chelsea Wolfe e ele gostou tanto da nossa música que criou um grupo tentando mobilizar uma galera pra ajudar a gente a ir pra lá um dia! Isso é incrível, de verdade. Então as redes sociais são realmente essenciais.
MAZU: A internet é a única forma de conseguirmos um alcance significativo. É também uma forma de manter a banda viva no consciente daqueles que seguem nosso trabalho, já que não conseguimos fazer show todo mês. É um pouco complicado porque ficamos muito dependentes do engajamento das pessoas nas redes sociais e muitas vezes não conseguimos. Mas quando as pessoas, da sua própria vontade, decidem compartilhar e mostrar pros amigos a nossa banda sem receber nada em troca, é muito gratificante.
CPR – Pra fechar, falem dos próximos planos e agenda de vocês.
TODOS: Por enquanto não temos planos concretos. Estamos indo atrás de shows, conversando com os nossos contatos de Curitiba e de outras cidades, e a ideia é fazer uma tour pequena. Também estamos para gravar um clipe, mas ainda sem data exata também. Agora é só esperar. Em breve voltaremos com novidades.
Que venha logo o clip e muitos shows!