Review – Adoráveis Mulheres

Little Women

Direção: Greta Gerving

Elenco: Saoirse Ronan, Florence Pugh, Timothée Chalamet, Emma Watson, Eliza Scanlen, Laura Dern, Meryl Streep, Chris Cooper, Louis Garrel e Bob Odenkirk

EUA, 2019

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Little Women, romance  de Louisa May Alcott, já foi adaptado diversas vezes para o cinema e para a TV.  As versões mais famosas são, provavelmente, a primeira, de 1917, com as estrelas do cinema mudo Isabel Lamon e Dorothy Bernard; a de 1949, com Elizabeth Taylor e Janet Leigh; e a de  1994, com Winona Ryder, Susan Sarandon, Christian Bale, Claire Danes, Kirsten Dunst e Gabriel Byrne. Também com um elenco de estrelas, é a vez de Greta Gerving apresentar sua versão da história das irmãs March. 

Nos anos 1860, na Nova Inglaterra, durante e após a Guerra Civil Americana, as irmãs Meg (Emma Watson), Jo (Saiorse Ronan), Beth (Eliza Scanlen) e Amy (Florence Pugh) vivem com a mãe, Marmee, (Laura Dern), enquanto o pai (Bob Odenkirk) se encontra na guerra, e fazem amizade com o  vizinho rico Mr. Laurence (Chris Cooper) e seu neto Laurie (Timothée Chalamet). Entre aprendizados e decepções, o filme acompanha a chegada das moças à vida adulta. 

A família vive em uma casa simples e, por conta da guerra e da ausência do pai, passam por dificuldades financeiras. Ainda assim, não deixam de ajudar outros em maior necessidade e de, com simplicidade, se divertirem. Marmee é o grande exemplo das meninas, sempre generosa. Ela inclusive recebe críticas da cunhada, a rica Tia March (Meryl Streep), por ter se casado com seu irmão, já que este, por conta de sua filantropia, não conservou a fortuna herdada. 

Meg, a filha mais velha, é a mais bem-comportada das moças. Tem talento para atuar, mas opta pelo casamento, embora fique claro que o faz por escolha própria. Jo é a escritora da família, sempre criando histórias e inventando peças para divertir as irmãs; não quer se casar e sonha viver de sua escrita. Beth é a mais doce das irmãs, muito tímida, é apaixonada por música, porém não deseja grandes plateias, apenas tocar para sua família. Por fim, Amy é a mais impulsiva e ambiciosa entre as quatro irmãs. Seu sonho é se tornar uma pintora proeminente. Entretanto, seu desejo, ao contrário das demais, não é apenas exercer seu talento, mas se tornar rica e famosa com ele. 

O livro é dividido em duas partes, o primeiro, Little Womens, aborda o cotidiano das irmãs, já a segunda, que se passa 7 anos depois, chamada Good Wives, mostra os rumos tomados pelas jovens.  Nessa adaptação, Gerving decide por acompanhar os dois momentos temporais em paralelo, em vez de cronologicamente. Essa decisão é acertada, principalmente porque permite  colocar em perspectiva tudo o que cada irmã precisa abdicar na vida adulta. Além disso, também permite que algumas sequências sejam espelhadas, criando um contraponto mais impactante,  como quando Jo acorda e desce as escadas procurando pela mãe, encontrando-a à mesa, mas em situações diferentes.

No entanto, essa decisão leva também a um pequeno problema. Por conta da concomitância dos dois períodos, a diretora também preferiu manter os mesmos atores vivendo seus personagens em épocas distintas, o que não chega a atrapalhar a narrativa, mas, principalmente no caso de Pugh, não funciona. Por mais que atriz se esforce em dar um tom juvenil a personagem, é difícil  engolir uma mulher de 24 anos, interpretando uma menina de 13. Não tem franjinha, tranças nem vestidos infantis que possam disfarçar essa discrepância. 

Aproveitando o gancho, a Amy de Pugh é um dos principais destaques do filme. A personagem que costuma ser representada como egocêntrica e meio frívola, o que ela é, ganha mais nuances na versão de Gerving. Amy é pragmática, não quer continuar vivendo na pobreza e tem consciência de que, como mulher, suas opções são limitadas. Por isso, não exita em bajular a tia rica, sabendo que ganhará algo em troca, coisa que a natureza romântica das irmãs as impede de fazer. Se ela está errada ou não, o espectador que decida, a questão é que a personagem se torna bem mais complexa do que o estigma de  irmã interesseira, sem deixar de ser um contraponto a sonhadora Jo.

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Saoirse Ronan  entrega uma Jo enérgica e carismática, como pede a personagem. Embora, com seus arroubos de rebeldia e tendência ao narcisismo, não seja nada muito diferente do que a atriz já fez em Lady Bird. Na fase adulta, Ronan acrescenta-lhe a melancolia de quem já teve que se conformar em fazer concessões em seus contos para conseguir publicá-los e que já não tem certeza se tomou as melhores decisões para seu futuro, o que deixa sua performance mais interessante.

Quanto a Timothée Chalamet, o ator se sai melhor na fase mais jovem do personagem, pois nos momentos bon vivant de Laurie, faz basicamente o mesmo que em Lady Bird, Beautiful Boy ou O Rei, inclusive com o mesmo ar blasé. Aliás, não fica muito claro (apenas subentendido) um dos pontos mais importantes do personagem: ele não está realmente apaixonado por nenhuma das irmãs, seu amor é pela união e companheirismo entre elas, algo que faltava em sua vida solitária, por isso sua insistência em se casar e fazer parte dessa família.

 Eliza Scanlen e Emma Watson têm menos destaque na trama. A primeira consegue aproveitar suas cenas para mostrar que Beth tem alguma personalidade, além de ser a \”irmã doente\”. Watson é correta, mas passa em brancas nuvens. Sobre a doença de Beth, me agrada que Gerving não tenha pesado a mão, preferindo um tom contido, evitando o dramalhão.

Gerving também acrescenta discussões contemporâneas sobre as limitações impostas às mulheres pela sociedade patriarcal, mas que acabam sendo traduzidas para o filme na forma de discursos das personagens (como o que Amy diz a Laurie que o casamento é uma transação comercial ou o que Jo desabafa com a mãe sobre o papel de esposa) que, embora verdadeiros, soam um tanto artificiais. 

Outro ponto importante sobre Adoráveis Mulheres, é que Gerving também utiliza de metalinguagem para enredar  a conclusão do livro à crítica a necessidade comercial e machista, imposta à própria autora Louisa May Alcott, de casar ou matar suas protagonistas femininas, adicionando uma ambiguidade ao desfecho da personagem. Uma forma de manter o final-feliz-padrão sem deixar de apontar o quão forçado ele é.

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